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Elementar, meu caro Watson!

Temos assistido com preocupação genuína à ausência de uma postura inovadora que com rigor nos mostre qual o Rumo que o País está a seguir.

Ouvimos vezes sem conta dizer que “o País tem Rumo” e até estamos disponíveis para acreditar que no plano teórico existem estratégias, concordemos ou não com elas, que visem atingir este objectivo. Mas o que nos mostra a prática é que ao invés de inovação, cada vez temos mais dos mesmos problemas.

O pomo da discórdia é que ao longo dos anos fomos, sistematicamente, informados de que ”se estava trabalhar nesse sentido” sem nunca identificar o sentido e que existiam programas que “paulatinamente” iriam ser desenvolvidos para resolver as insuficiências que a cada dia se tornavam geométricas, perante uma incapacidade de resolução, que se traduzia de forma aritmética. Ao longo dos últimos vinte anos assistimos à criação de dezenas de Comissões Técnicas que se esgotaram na sua própria incapacidade ou na falta de vontade política, sem que ninguém nos explicasse o motivo das suas mortes súbitas.

O que de facto não faz sentido nenhum é a manutenção de um erro que quase já assumiu uma dimensão histórica. Este pormenor é o maior enigma que temos que resolver, sob pena de nos afundarmos no próprio do Rumo que deixámos de controlar. Quando abrimos o jornal e somos informados que Cabo Verde nos ultrapassou em todos os sentidos, ficamos com a certeza de que o Rumo está desnorteado, provavelmente perdido nos labirínticos corredores de interesses do poder ou qui ça adormecido após a conquista eleitoral que outorga a enganadora sensação de quão valoroso é o trabalho desenvolvido, não obstante os avisos à navegação que são constantemente feitos, sobretudo, por cidadãos independentes e com competente idoneidade moral e técnica.

A paz pressupõe desenvolvimento e este exige um plano cuja eficiência seja visível, duradoira e ao mesmo tempo garanta o aumento do rendimento dos cidadãos e a consequente melhoria das suas condições de vida. Um plano que seja avaliado a cada etapa e que permita corrigir as insuficiências. Não estamos a afectar a redução do desemprego quando aos jovens é exigida experiência na candidatura ao seu primeiro emprego. Não estamos a combater a dependência comercial externa quando fazemos uma Zona Económica Exclusiva obsoleta e sem nenhuma avaliação de desempenho das mais-valias esperadas.

Não estamos a criar sustentabilidade alimentar quando nos dizem que nem as bananas do Vale do Cavaco (local ancestral de plantação bem sucedida de bananas desde o tempo colonial) estão a salvo, para dar exemplo de um produto em que poderíamos ter uma vantagem comparativa quer ao nível do consumo interno quer ao nível da criação de um eficaz expoente de exportação.

Não estamos a reconstruir as vias estruturantes, nem as secundárias ou terciárias quando temos que intervir nas mesmas vias diversas vezes porque a “fiscalização” foi míope e não reparou que a quantidade de asfalto era manifestamente inferior ao valor pago.

Não estamos a desenvolver a qualidade de ensino, sobretudo primário, se não temos professores de qualidade em número suficiente para leccionar nas novas escolas e insistimos neste orçamento miserável, porque nunca mais percebemos que a promoção da educação pressupõe investimento no capital humano e que é este que promoverá o retorno do investimento feito no betão.

Não estamos a desenhar um quadro industrial de vanguarda que nos alivie da dependência do sector petrolífero quando se pretende que se faça indústria com recurso ao gerador.

Não lograremos sucesso enquanto tivermos uma televisão e um jornal públicos que não conseguem perceber que a sua oferta é medíocre e sem valor acrescentado, pois sem debate e sem o contraditório o que se manifesta são monólogos para boi dormir.

Não iremos longe enquanto tivermos a maioria da população a viver em bairros sem qualquer sanidade ou salubridade não obstante o sentido de voto se ter mantido fiel. É que a conquista da PAZ pressupõe desenvolvimento sustentado e este pressupõe que a cada dia e a cada objectivo alcançado se passe para o nível seguinte. O nosso problema é que não conseguimos sair do nível primário de atendimento básico, em todos os sentidos.

Não conseguimos sequer um canalizador decente que nos resolva o problema do saneamento básico, como aconteceu com outras cidades que tinham problemas idênticos, no início do século XX, para que não tenhamos que ir ao passado colonial encontrar um governador incompetente e torná-lo réu porque não previu que cinquenta anos depois o Cazenga teria mais gente que a província do Bié ou que o Principado do Mónaco.

O nosso problema é que não temos modéstia suficiente para admitir que não estamos a conseguir e que provavelmente precisamos de ajuda honesta, a exemplo de uma consultoria escandinava ou japonesa. E admitir isto é o que fazem os países que sabem que as sociedades vivem de empréstimos. É que já não podemos a inventar a roda, porque infelizmente ela já foi inventada.

Como diria Sherlock Holmes ao Dr. Watson, seu companheiro de trabalho, quando a solução do problema se tornava visível através de um raciocínio lógico: “Elementar, meu caro Watson”!

 

 

Marcações: sustentabilidade, rumo nacional, ensino, agricultura