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Os Candidatos

Com a revisão da Constituição em 2010, passamos a eleger os membros da Assembleia Nacional e o Presidente da República numa única eleição, que acontece de cinco em cinco anos. Esta revisão, que para muitos é entendida como um salto qualitativo no nosso ordenamento jurídico, constitui, para mim, um tremendo retrocesso no que à minha liberdade de escolha diz respeito.

Desde logo, porque sou obrigada a aceitar que ao votar num determinado partido eu estarei também a votar no seu candidato à presidência que é sempre o número um da lista de deputados. Isto inibe a minha opção, pois eu posso querer votar no partido x para ser governo e no candidato y para ser presidente. Ou posso querer abster-me de votar na eleição presidencial e este modelo impede-me pois os candidatos presidenciais estão enfiados debaixo das saias dos seus partidos e não surgem de forma independente. Fruto desta revisão, também deixamos de ter a figura do candidato presidencial independente.

Ao fazer isto o legislador assumiu que as iniciativas políticas se esgotam nos partidos políticos. Erro crasso. Existem figuras em todas as sociedades que congregam muito mais simpatias, capacidade e idoneidade que muitos políticos militantes, sendo consideradas verdadeiras bússolas. E a sua acção é sempre muito mais eficaz pois não estão amarrados a nenhum tipo de obediência partidária e por isso são livres e muito mais inovadores.

Mas ainda assim estão impedidos, de forma independente, de exercer a sua cidadania. Esta inibição não permite o surgimento de sangue novo já que os partidos políticos, de uma forma geral, em África são máquinas pouco oleadas para as mudanças de liderança. Tendo em conta a "atipicidade" eleitoral e a complicada situação que o País atravessa estou curiosa para conhecer o Plano B (tendo em conta que o Plano A já vimos em2012) dos próximos candidatos às Eleições Gerais de 2017, nesta que será a quarta eleição a que os angolanos serão chamados para decidir quem serão os titulares dos cargos governativos. A minha curiosidade prende-se com o facto de ter havido muito pouca novidade em termos de programas, alternativas, pessoas e sobretudo pela acomodação aos cargos públicos. Existem deputados que estão na Assembleia desde o tempo da I República e no caso da oposição desde 1992. Muitos dos que estão nestas condições já não são produtivos, já não têm ideias novas e por isso já não constituem uma força activa para nos representar. Por esta razão considero que o número de mandatos dos deputados também devia ser limitado, pois a condição, de servidor público, perde validade quando se torna num emprego.

A faixa etária dos nossos representantes na Assembleia é outro assunto que deve ser revisto. Num País maioritariamente jovem não é possível ver tão poucos jovens deputados, o que significa que os interesses da juventude não serão salvaguardados tendo em conta o fosso de gerações. Isto não se compreende quando é aos jovens que os partidos pedem ajuda em todas as campanhas eleitorais, são eles a alavanca que impulsiona os partidos para as actividades e para a mobilização. E quando falo jovens deputados falo dos que têm menos de 35 anos, não daqueles que acham que ser jovem vai até aos 50 anos. Conhecer os candidatos à presidência também aguça a minha curiosidade. Estamos numa mesmice.

De todos os lados os candidatos que existem não foram renovados dentro dos seus partidos, são os mesmos. À excepção da CASA-CE, não foi criado nenhum novo partido ou coligação que tenha assento no Parlamento e por isso é o único líder novo. Esta situação também é importante analisar. A criação de um partido político ganhou novas exigências, face à anarquia que se viveu desde 1992, com a facilidade com que de "olhos fechados" muitos par-tidos foram reconhecidos. Depois foi preciso disciplinar, com razão. Mas o fio foi demasiado esticado tornando praticamente "impossível" a criação de novos partidos face ao investimento e à burocracia. Governar com as Pessoas tem sido o principal motivo da decadência da nossa democracia. Não tem sido possível, por isso está doenteA opinião dos cidadãos nunca é levada em conta, sobretudo quando é contrária aos interesses dos "negócios públicos". Alguns meios de comunicação social participam nesta anestesia geral. É preciso conjugar uma reforma profunda do actual modelo democrático cujo objectivo seja centrado na justiça social, voltada para os pequenos sistemas: a aldeia, o bairro, a rua, a família.

O mundo mudou. Mudaram as relações de mercado, mudaram as relações pessoais, mudaram os modelos económicos, mas a nossa democracia mantém-se estática e convicta de que para existir basta que o povovote. Só podemos evoluir em democracia quando valorizarmos a diferença.

Por todas estas razões espero que os CANDIDATOS de 2017 nos surpreendam pela positiva. Que sejam audazes nas ideias e nas pessoas. Que sejam capazes de sair do modelo interesseiro de estrito apelo ao voto e falem, olhos nos olhos, semnos mentirem como vai ser a nossa vida no dia seguinte. Que não prometam nada que não possam cumprir, porque somos nós que somos o soberano. Que nos mostrem qual é a sua opinião sobre o ambiente, a diversificação da economia, a falta de investimento no sistema educativo, a "morte" da agricultura nacional, a atrofia da cultura, a defesa dos direitos civis e humanos dos cidadãos, como travar a corrupção e ter um saneamento decente. Que nos mostrem o que valem, o que defendem e que não seja apenas o seu partido a falar com base num programa. Queremos conhecer a qualidade das pessoas que se apresentam como candidatos. Queremos debates entre os candidatos, queremos ter a certeza de que valem o nosso voto.

A democracia não pode estar saudável quando eu voto num determinado partido, porque me prometeu um determinado programa, estabelecendo- se entre nós um contrato. Eu cumpro e ele não. E eu não tenho nenhum poder legítimo, urbano e pacífico para o fazer cumprir as promessas eleitorais ou pedir a sua demissão por incumprimento do "contrato". Quem sabe se em 2017, vamos ouvir candidatos, mentes brilhantes que tenham tido a maior das ideias, e sejam essas ideias que nos possam devolver o poder da nossa soberania individual. Embora muitos não acreditem, se é possível travar uma revolução, não há nenhum poder que seja capaz de travar uma ideia. E o poder de uma ideia pode mudar um país. Mandela provou isto

in http://agora.co.ao/Agora/Artigo/60313

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