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A pátria não acontece, constrói-se!

A falta de patriotismo de todos aqueles servidores públicos que 'colocaram' o 'seu dinheiro' a salvo noutros países, no tempo da bonança de todas as vacas gordas, sem que qualquer imposto taxasse as 'suas fortunas', é demonstrativa da ausência de confiança na economia nacional e constitui, ao mesmo tempo, factor de insegurança nacional.

A comemorarmos, este ano, o 40º aniversário da Independência Nacional olho para a nossa história, felicitando todas as lutas que foram travadas para que fossemos soberanos e respeitados, agradecendo a todos os cidadãos conhecidos e desconhecidos, que no mais simples gesto, permitiram que um ciclo confrangedor terminasse e ganhássemos um país.

Mas não posso deixar de lamentar os desencontros que ainda subsistem, a ausência de diálogo, a intolerância à liberdade e a morte de pessoas inocentes que tal como os nossos pais e avós, no tempo em que o país ainda não era nosso, apenas reclamavam aquilo que entendiam ser válido para a dignidade humana. Assistimos, após a Independência, ao enfraquecimento de um orgulho genuinamente nacional. Deixamos de ser, antes de qualquer outra coisa, angolanos. Primeiro somos do MPLA ou da UNITA, depois somos do norte ou do sul, depois somos do Petro ou do d´Agosto, negros ou mulatos, católicos ou evangélicos e só no fim, somos Angolanos. E no meio deste enorme desencontro nunca defendemos, à excepção da paz, uma outra causa que se fosse universal, que fosse de Todos. É claro que muitas vezes isto só não acontece porque entre nós tudo é demasiado politizado, tudo tem que ser enquadrado dentro do parâmetro do elogio e das benesses e raramente em nome apenas da Causa.

A Causa tem que ser, por si, um factor de união, sem partido, sem credo, sem raça, sem agendas pessoais, apenas no interesse da maioria dos cidadãos angolanos.No nosso país calaram-se as armas de guerra, mas surgiram outras armas que são inimigas da segurança do Estado. O sofrimento provocado pela desigualdade entre os muito ricos e os muito pobres que são a maioria da população, a fraca competência do progresso social nacional face ao crescimento do PIB que Angola apresentou nos últimos dez anos, que se traduziu num desenvolvimento social medíocre e sem garantias para os mais desfavorecidos é um factor de insegurança nacional.

A corrupção que se generalizou em Angola, que é a culpada por todas as insuficiências da Reconstrução Nacional, pela falência técnica de muitas empresas públicas e por uma gestão pouco transparente do erário público, que nunca foi inibida pela Tolerância Zero da Lei da Probidade e que é olhada com condescendência, por algumas entidades executivas, como sendo uma "prática que acontece em todo o mundo" é um dos nossos maiores factores de insegurança nacional. A falta de patriotismo de todos aqueles servidores públicos que "colocaram" o "seu dinheiro" a salvo em países estrangeiros no tempo da bonança de todas as vacas gordas, sem que qualquer imposto taxasse as "suas fortunas", é demonstrativa da falta de confiança na economia nacional e constitui ao mesmo tempo um factor de insegurança nacional.

As precárias bases onde se alicerça a economia nacional, que depende exclusivamente do petróleo, numa altura em que o mundo dá sinais de redução da sua procura, sem que nunca se tivesse investido com rigor e sustentabilidade na tão almejada diversificação da economia, situação que é sobejamente comprovada pelos anteriores OGEs, são preocupantes factores de insegurança nacional. Os objectivos do Plano Nacional de Desenvolvimento 2013/2017, que não estão a ser alcançados, a exemplo das políticas agrárias, por não serem devidamente orçamentados, por não serem avaliados e por nos últimos anos nunca terem conseguido umgrau de execução superior a 50% e que se traduzem em Fome em Angola, são, igualmente, indesmentíveis factores de insegurança nacional.

Cobrar um serviço de electricidade intermitente e precário em todo o país, sendo esta a área chave para a diversificação da economia, mantendo a economia nacional a funcionar com recurso a geradores, permitindo que o custo de crescimento do país seja disfuncional e obrigando a maioria das famílias a viverem de forma rudimentar, é outro exemplo de insegurança nacional.

Os compromissos internacionais que assinamos, mas que não conseguimos cumprir, a exemplo dos Objectivos do Milénio, onde falhámos na linha de partida, quando afirmámos que nas actuais condições seríamos capazes de reverter a mortalidade infantil, que nos colocou, nos últimos anos, nos piores lugares do ranking mundial, é um exemplo acabado de insegurança nacional.

A elevadíssima taxa de desemprego, que se constitui num problema económico e que é um dos promotores da pobreza e da exclusão social e o elevado custo da cesta básica, que aumenta a pobreza no seio das famílias empregadas e se torna incomportável para os que estão desempregados ou exercem actividades precárias no mercado informal, sem que se prevejam medidas de alívio, constitui à vista desarmada um poderoso factor de insegurança nacional.

A falta de uma educação com qualidade para a juventude, que é a maioria da população eleitora, que tem opinião e expectativas, mas que é perseguida por pensar diferente, excluída no acesso ao emprego por insuficiência de qualidade técnica e não encontra espaço para se fazer ouvir, como devia acontecer em democracia, é um nefasto factor de insegurança nacional.

A ausência de um programa nacional de Registo que fosse rigoroso e sistemático, que durante anos, "promoveu" a entrada ilegal em Angola de centenas de cidadãos que hoje "são angolanos" deverá ser encarada no âmbito e espírito da perda de controlo de "quem é quem", o que constitui um exemplo perigoso de insegurança nacional. Permitir que milhares de cidadãos que não podem fazer prova da sua nacionalidade, porque não têm Bilhete Identidade, possam ter um Cartão de Eleitor que é uma presunção de nacionalidade (porque só os cidadãos nacionais podem votar) e que foi conseguido com uma "prova testemunhal", constitui um factor de insegurança nacional.

O desleixo com que são tratados a maioria dos antigos combatentes e veteranos de guerra, que reclamam no deserto desde a instauração da democracia sem que consigam ter um atendimento que demonstre o agradecimento, fora do quadro de alguma festividade, por todos os seus sacrifícios e das suas famílias é um exemplo de insegurança nacional.

Os órgãos de comunicação social públicos, que todos os dias desenterram o passado que todos julgávamos morto ao abrigo do Acordo do Luena, mas que afinal volta e meia surge para abanar os machados da guerra de forma vulgar, continuando a olhar para o adversário como sendo um inimigo, fazendo crer, constantemente, que a paz está em perigo, são um factor de insegurança nacional.

A constante afirmação, assumida publicamente por muitos dirigentes, de que a democracia que temos "foi-nos imposta" e apenas "quando dá jeito" somos um país democrata porque podemos votar, esquecendo, no entanto, os princípios elementares da vida em democracia, tais como a Liberdade, Justiça, Igualdade, Solidariedade é outro mau exemplo que promove a insegurança nacional. Muitos e exaustivos seriam os exemplos que colocam o Estado angolano numa situação de insegurança social, política e económica. Não basta construir uma escola, é imperativo garantir também no mérito do professor.

Não chega construir hospitais de referência sem que se prevejam com eficácia todos os recursos humanos necessários para a melhoria do atendimento dos cuidados de saúde. Não serve de nada ter um novo e belo edifício para a Assembleia Nacional se esta não pode exercer uma das suas principais funções que é a fiscalização dos actos do Executivo, em nome do soberano que é o povo que os elegeu. O papel dos Governos do pós-guerra é vital para o fortalecimento da Pátria.

E para isso é preciso que haja coerência, que existam exemplos de boas práticas para que o processo de reconstrução em todos os sentidos seja efectivo e produza efeitos duradoiros. Não queremos continuar a ver crescer uma nação desconfiada, insegura e órfã de um sentimento de unidade. Sem Justiça social e sem Liberdade a Pátria não se constrói.

 

in http://agora.co.ao/Agora/Artigo/59187

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