As Mães da OMA

Há mínimos olímpicos abaixo dos quais as pessoas e as coisas perdem o sentido. E "quando os sentidos nos falham, a razão tem que intervir" como disse Arquimedes.
Ao aceitar fazer o papel que fez, para abortar a manifestação das Mães dos jovens activistas presos, a OMA retirou-se do objectivo da sua organização. É que não podemos estar disponíveis para todos os papéis, por maiores que sejam a fidelidade ou a recompensa.
Estou preocupada com a forma como o Estado se tem tornado, literalmente, "propriedade" do MPLA. As manifestações "espontâneas", que acontecem a cada vez que outros pretendem exercer o seu direito de manifestação, apenas são autorizadas aos militantes deste partido. Só eles podem, realmente, ter acesso ao artigo 47.º da CRA.
E só neste momento é que um dos principais elementos da democracia formal acontece e se exerce! Não precisam de aviso prévio em carta dirigida a entidade competente, nem de autorização, apesar de esta estar ausente das exigências da CRA. Podem tudo e de repente, num instante, surgem do nada e comemoram datas e feiras acabadas de anunciar, provando que só os militantes e "contratados" do MPLA são angolanos. Os outros cidadãos estão a ficar apátridas. Pois perdemos a nacionalidade a cada vez que nos retiram a cidadania. Há mínimos olímpicos abaixo dos quais as pessoas e as coisas perdem o sentido.
E "quando os sentidos nos falham, a razão tem que intervir" como disse Arquimedes. Ao aceitar fazer o papel que fez, para abortar a manifestação das Mães dos jovens activistas presos, a OMA retirou-se do objectivo da sua organização e da consideração que eu ainda tinha pelos exemplos que me têm sido relatados de apoio a várias mulheres e Mães que a esta organização se dirigiram, fosse do ponto de vista jurídico ou de aconselhamento. É que não podemos estar disponíveis para todos os papéis, por maiores que sejam a fidelidade ou a recompensa.
Historicamente a OMA desempenhou um papel muito importante, num tempo onde o lugar da mulher era nas traseiras da casa, no tanque e na cozinha, elas saíram jovens e mulheres e foram combater. Este salto para a liberdade de construir um futuro diferente do passado das suas avós, foi seguido por muitas mulheres corajosas e cuja dignidade é inquestionável. Com que objectivo? Libertar os seus filhos, pais e irmãos de todas as injustiças de leis arbitrárias e de todas as cadeias que os retinham de forma infundada violando-lhes a dignidade e a esperança. E muitas delas morreram, em nome dos filhos, na certeza de que um dia o povo angolano seria uno e indivisível, tal como a Pátria. E é a estas Heroínas que a OMA do século XXI embacia a glória, quando se torna num instrumento incapaz de olhar para o lado e deixa de ver outras mulheres, que sejam apenas isso, mulheres angolanas, pois não obstante o que a justiça venha a provar quando forem julgados, não conheço uma só Mãe que, num momento de dor, abandone o seu filho.
O comportamento da OMA foi feio. Pior que isso, não foi honesto. Porque em todas as campanhas vos ouvi falar em nome da mulher e das Mães angolanas. Foi para todas nós (mesmo quem não é do vosso partido como eu) que dirigiram os vossos discursos na televisão e na rádio a falar das vossas intenções de serem porta-vozes de todas as angústias e conquistas das mulheres de Angola.
E num momento de dor, fecham os olhos e "permitem" (pois não se manifestaram em contrário, mesmo à posteriori) que mulheres, sobre quem não pesa qualquer delito, à excepção do facto de serem Mães de jovens, que até prova em contrário beneficiam da presunção de inocência, sejam espancadas e vejam violado o seu direito à livre expressão da sua opinião, enquanto as senhoras fingem que vivem num país normal? Quantos dos vossos filhos já comentam em casa a dor que sentem por não terem tido as mesmas "oportunidades" que "outros filhos" do vosso partido? Quantos dos vossos filhos já vos disseram que estão fartos da vida que têm?
Quantos dos vossos filhos não concordam com a actual política do vosso partido e se tornaram dissidentes domésticos? Eu conheço alguns! Quantos filhos as senhoras mandaram estudar fora por não acreditarem no sistema nacional de ensino e quererem dar-lhes um futuro com mais garantias? Quantas vezes em silêncio lhes dão razão e reconhecem que este País não é para todos os jovens? Isso faz das senhoras más pessoas? Não! Não faz! Faz-vos Mães!
Enquanto Mães, as senhoras da OMA, recusam-se muitas vezes a dar a cara por causas que são da mulher angolana. Vimos mulheres zungueiras (que devem ser a maioria das mulheres eleitoras no País, tendo em conta que a única saída para atenuar a pobreza é a venda ambulante), que palmilham a cidade de madrugada ao anoitecer, com filhos nas costas, apenas para jantarem, serem espancadas, roubadas e amedrontadas por alguns elementos, de fraca conduta, das autoridades e as senhoras ficaram caladas.
Não são estas mulheres angolanas a quem em tempo de eleições a OMA solicita o voto nas passeatas que faz pelos mercados e bairros? É na qualidade de Mãe que sinto a dor de outra Mãe, sempre que em causa está o seu filho.
Seja por estar doente e poder ser uma futura vítima da mortalidade infantil. Seja porque não beneficia de qualquer igualdade de oportunidades à nascença para competir com justiça por um futuro melhor para si. Seja porque os filhos crescem e, mesmo quando não concordamos com eles, ganham asas e desatam a voar pelo caminho que a sua consciência indica. Mas nós continuamos suas Mães!
Não se distanciem do povo, sobretudo das mulheres angolanas que de braços abertos sempre vos receberem e vos escutaram. Não se tornem demasiado frias, incapazes de serem solidárias apenas com o sofrimento de qualquer Mãe, não obstante a cor partidária ou o politicamente correcto.
Não pese sobre a vossa consciência a dualidade em que muitas vivem, criticando no interior do vosso lar (também conheço algumas) e ao mesmo tempo levantando a bandeira em público em aplausos para pessoas ou actos com os quais já não concordam. Angola é um País imenso, para a quantidade de filhos que tem. Somos poucos. Somos poucos para transformar o País formal num País de igualdade de oportunidades, de progresso social que tem que reflectir bem-estar e um futuro justo para os nossos filhos.
E isto não impede que no caminho protestemos, de forma educada, pacífica e urbana e que façamos avaliações sobre aquilo que não estiver bem. Da crítica nascem melhoras para quem aprende a ouvir os outros. Sobretudo quando a governação depende, exclusivamente, do voto. Felizmente é na partilha de opiniões que vencem as mais capazes e mais justas e são estas que se manifestam como as mais eficazes para a maioria das pessoas.
Esta sempre foi a postura dos Sobas de verdade. Mas se decidirem continuar no caminho da convicção de que há mulheres mais angolanas do que outras (e têm esse direito), uma vez que nem todas têm a mesma aura de "protecção" institucional, então, por favor, não voltem a falar em nome da mulher angolana como um todo, a falar dos problemas, das conquistas e dos sonhos, já que não estarão a ser verdadeiras, pois foram atitudes de indiferença de muitas senhoras que fizeram com que a OMA seja hoje, objectivamente, reconhecida como a Organização da Militante Angolana
Marcações: povo